quinta-feira, agosto 31, 2006

Ditado japones

Ontem, quarta-feira, meu professor colocou um ditado japonês na lousa para os alunos. Segundo ele, este é um ditado antigo, onde ainda se utiliza um linguagem antiga, que não se usa mais.
Ninguém deu muita bola pro que ele escreveu. Acho que ele já sabia disso. Acho tambem que ele sabia que às vezes um ou outro olha com maior atenção e assimila a verdade daquilo.
Sua tradução fica mais ou menos assim:

As flores do vizinho sempre parecem mais vermelhas
Ao olhar para o lado você se distância de suas flores
O musgo não cresce nas pedras que rolam pelo rio

domingo, agosto 27, 2006

Cavocando as raízes da família Murakami


Eu e o casal Murakami. O homem à direita é o Kazutoshi Murakami


Um portal gigante que fica no interior de Okayama



Num dos templos que visitamos, nao me lembro o nome. Foram vários...

Sábado, dia 26 de outubro de 2006, fui encontrar com o primo do meu pai, o Sr. Kazutoshi Murakami. Em japonês, Murakami-san.

Juntando meu parco conhecimento do japonês e seu acentuado sotaque da região de Okayama, acho que consegui entender uns 40% de tudo que ele me disse. Ele me contou tanta coisa sobre as histórias de nossa família, o destino de cada um dos irmãos e de seus descendentes, sua vida, suas opiniões, seu modo de pensar...como eu gostaria de entender melhor o japonês...me ajudaria em muito a entender melhor o povo japonês.

Deixando as lamentações de lado, redijo aqui o que consegui absorver de nossas conversas.

Kazutoshi Murakami nasceu na cidade de Takahashi no ano de 1937, durante o período da guerra entre Japão e China. Ele é o segundo filho de Tetsuiti Murakami, irmão mais velho de meu avô. Estudou até o colegial em Takahashi e conseguiu cursar uma faculdade, coisa muito difícil para alguém nascido nessa época. Sua infância foi extremamente difícil tendo em vista a Guerra contra os EUA, a falta de comida, buscando refúgio contra bombas, o medo. Trabalhou uns 30 anos como funcionário do governo de Okayama, o que lhe permitia fazer viagens constantes dentro da província. Teve um filho e uma filha. O filho infelizmente morreu aos 10 anos de idade. Sua filha, agora com 36 anos, se casou em maio desse ano. Ele fala rindo que sua filha se casou com um filho já nascido, ou seja, já não era mais virgem. Pensei, é meu caro meio-primo Kazutoshi, os tempos são outros...

Takahashi é uma cidade que fica à beira do rio Takahashi mas que se estende ao longo do cenário montanhoso. Uma cidade interiorana, bela, cheia de histórias, fica num vale, cenário típico da região. O trilho do trem que corre ao longo do rio, montanhas por todos os lados, casas seculares, tudo muito bem cuidado, bonito. A impressão que eu tenho é que tudo parece estar no seu devido lugar, como deve ser.

As casas antigas, comuns na região, são sempre com frente estreita e fundo comprido. Geralmente tem um comércio na frente e aos fundos é onde eles moram. Se tiverem espaço montam um jardim japonês, plantam umas verduras, frutas. Engraçado que a casa da minha avó no Brasil também tem esse formato. Nos fundos ela tem um jardim onde ela cuida d´um pé de caqui gigante, flores e de vez em quando planta umas frutas como morango e outras coisas. Engraçado como essas coisas de educação e coisas aprendidas na infância influenciam no modo de viver das pessoas...

Ele me levou para ver alguns familiares e muitos templos budistas e xintoístas. Um dos templos, o Rakyuji Temple, tinha um jardim japonês belíssimo, bem no estilo zen budista. Dentro dele dava pra sentir uma paz de espírito imensa. Kazutoshi fez um comentário: Seria ótimo se tivesse um copo de sake agora e beber enquanto se admira o jardim...

Por último, falo de meu bisavô. Seu nome era Yonekiti Murakami. Sua mulher se chamava Massano e tiveram 5 filhos. Foi ele que me passou essa minha vista ruim. Seu trabalho era comandar os barcos que transportavam mercadorias, e que corriam ao longo do Rio Takahashi até desembocar no mar. O dia inteiro percorri estradas que andavam ao longo desse rio. O rio é largo, mas raso, pedregulhos nas margens e o cenário de montanhas altas em volta. Fiquei olhando o rio e imaginando meu bisavô remando e navegando aquelas águas. Dá até saudade. Uma vontade louca de tê-lo conhecido, de saber como ele era.

sexta-feira, agosto 25, 2006

Não percam! A maior peça de teatro já encenada!

A cada dia um novo começo. Percebo que a vida corre como um ciclo, a todo momento reiniciando e reciclando os relacionamentos, como num jogo quando no término de uma rodada apenas muda-se a disposição das peças, trocam-se alguns jogadores e o jogo recomeça, num jogo sem fim. O eterno jogo da vida.
Pessoas vão, alguns ficam e novos personagens entram na estória. Cada vez mais tudo parece uma monumental peça de teatro, uma grande mentira.
No final da tarde, olho para o céu, o horizonte. Um céu de azuis, violetas, roxos, laranjas. Belíssimo. Como se tivesse uma grande mão por trás pintando aquela cena. E os prédios que de dia pareciam tão reais, agora parecem maquetes de um cenário feito de papel e plástico. Tudo parece não ter tanta importância assim. Talvez o crepúsculo tenha o poder de revelar certas coisas que não vemos em outros momentos.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Pessoas, histórias, experiências...

Fotos dos últimos dias, o que tenho feito de bom, os eventos que tenho participado.


Domingo de tarde, num almoço de cultura do Laos. Quem nos chamou foi a família Tanaka que fizemos homestay. A garota no centro dançou uma dança típica do Laos para os cinvidados


Com o pessoal do Sawara num jantar de comemoração do segundo lugar no Matsuri


Segunda-feira, com a Minami-san, irma do meu avô e a filha dela.


Terça-feira, jantar de boas-vindas ao Edu e a Linade Tóquio, num restaurante de Curry com a galera de Okayama

O Caminho do Japonês

Minha mãe me mandou um email hoje com uma mensagem da Seicho-No-Ie muito boa. Posto aqui para compartilhar com todos:

"QUEM APROVEITA BEM O TEMPO VIVIFICA A PRÓPRIA VIDA". Se você sempre tiver à mão um livro e um caderno, poderá ussar seus momentos livres de modo bastante proveitoso, lendo, tomando nota, redigindo algo, esboçando um desenho etc. Pare de se lamentar que não dispõe de tempo. Tempo é algo que deve ser criado, encontrado, explorado, aproveitado, vivificado. A Vida é tempo, e, por outro lado, o Tempo é Vida.

Recebi uma revista de Artes e Cultura do Japão de uma amiga de minha tia de Kobe. Um de seus artigos fala sobre o grão-mestre de cerimônia do chá, a décima-sexta geração de uma família de mestres, um cara chamado Sen Soshitsu.

De acordo com o texto, o Chado, ou o Caminho do Chá, nasceu no século 14, incorporou o espírito Zen, e sobrevive até hoje como parte integral da cultura japonesa. É definido como uma meditação silenciosa. Meditação em movimento. Convidando pessoas para tomarem chá, fazendo o chá e servindo-as, cultiva-se o espírito e as maneiras.
Suas palavras: Assim como um monge Zen pratica sua vida inteira no seu aperfeiçoamento espiritual, a pessoa que pratica o Chado deve praticar sua vida inteira, dia após dia, na sala de chá.

A Cerimônia do Chá reflete em muito o modo de agir do japonês. Percebo isso em cada lugar que vou, numa loja de conveniência, na rua conversando com as pessoas, numa roda de amigos. O japonês dá extrema importância à polidez, ao ser gentil, ao sorriso. A aparência, o visual é sempre impecável, em qualquer lugar que se vá.
Na própria língua japonesa, há formas diferentes de se falar com as pessoas. Para cada situação as palavras que se usam são diferentes. Por exemplo, há jeitos diferentes de se falar "você". Quando a pessoa é inferior a você, como um empregado, um filho, alguém mais novo; quando a pessoa é igual a você, como um amigo, alguém de mesma idade, alguém com mesmo cargo; ou alguém superior, como seu chefe, seus pais, alguém mais velho.
Nas lojas, os funcionários sempre usam a forma mais polida para falar com os clientes. Essa coisa do treinar as maneiras, o modo de agir para polir o interior.

Até o próprio cumprimentar, onde se abaixa a cabeça, na minha opinião reflete um pouco isso. Não é um cumprimentar de mãos, onde a imagem é de uma parceria entre iguais. Num cumprimento típico japonês, o que parece para mim é o se rebaixar, mas não num sentido ruim, negativo, mas que demonstra humildade perante a pessoa que se cumprimenta. O que nos remete à filosofia Zen budista, o ser polido sempre, nunca criar intrigas, nadar sempre pra aonde a maré corre, a fluidez, o redondo, macio. Nunca quadrado, arestas pontiagudas. Sempre arredondado.

Mas percebo também que muitos japoneses aprendem a ser polidos sem compreenderem o real significado de tudo isso. Quantas vezes não entrei numa loja e o que vi atrás da máquina registradora era um robô repetindo palavras polidas sem sentimento algum, ou pior, e como na maioria das vezes, sem sequer olhar no meu rosto. Sempre que posso, tento parar e olhar nos olhos das pessoas e procurar um olhar, dar um sorriso, dizer Arigatougozaimasu e sair.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Algumas fotos da escalada do Monte Fuji


O comeco da viagem, no quinto estagio do Monte Fuji.


Uma vida por um amanhecer

Monte Fuji. A melhor aventura que já vivi. Um desafio que colocou minha confiança e perseverança à prova.
Conversando com o Leandro, a idéia de subir o Monte Fuji surgiu por acaso.
Começamos a caminhada lá pelas 7 da noite, quase anoitecendo. Um subida íngreme, difícil. Muita pedra, terra e poeira que dificultavam a caminhada. Muitas paradas para descanso, recuperar o fôlego, molhar a garganta com isotônico e seguir viagem.
Foram 5 horas de subida pela rota Fujinomiya, a mais curta, mas a mais íngreme, segundo o que ouvi.

Quando cheguei ao topo, achei que tinha sido fácil. Subimos rápido, sem paradas grandes. Mal sabia eu que o maior desafio estava por vir.

Chegamos ao cume às 0:30 da segunda-feira. Estavamos cansados e assim como todos os que lá estavam, deitamos na terra mesmo e tiramos um cochilo. Uma hora depois acordei de frio, meus pés e minhas mãos estavam gelados, apesar das luvas. O vento cortante irritava meu rosto. Meu nariz e as pontas da minha orelha estavam vermelhas pelo frio.

À medida que o tempo passava, o frio ia subindo pelo meu corpo através dos pés, das mãos, do rosto. Minhas pernas, que antes estavam aquecidas pela roupa já não conseguiam mais conter o calor. Uma sensação horrível, um arrependimento de ter chegado tão cedo, de não ter trazido um gorro, um saco de dormir, uma barraca para nos proteger do frio, uma toalha para cobrir o rosto.

Às 4 da manhã, eu já pensava em desistir de assistir o nascer do sol. Já não aguentava tanto frio e minha confiança estava totalmente abalada. Tinha resistido até aquele momento com minha postura positiva mas ela já estava se esgotando.
Foi quando olhei o céu e percebi uma claridade no horizonte. Estava finalmente amanhecendo! Corremos para um ponto mais alto para admirarmos mehor o espetáculo.
Sem nuvem alguma. Sem chuva. Sem dúvida, a cena mais bela que já tive em minha vida.

Do cume do Monte Fuji, como se fosse um Deus que do alto tudo enxerga, presenciei os primeiros raios de luz. O céu era uma gama de cores que vai do vermelho, do violeta, do amarelo, azul , azul escuro. Um azul que nunca tinha visto antes, puro, límpido. O mais belo gradiente de cores. Vi quando a luz começou a alcançar as cidades que antes estavam obscuras. Vi o litoral, o mar, a terra. E o sol vermelho, como um olho de fogo que surge no horizonte. Magnânimo. Como um rei que vem em minha direção com seu reluzente manto vermelho.

Neste momento, esqueci quase que inteiramente do frio que me dominava. O desafio tinha chegado ao final e eu tinha vencido. Vencido o frio, vencido as circuntâncias, vencido a mim mesmo.

Ao final, um agradecimento especial a meu grande amigo Leandro. Desde o começo me identifiquei contigo e desde então tenho dado muitas risadas nestas nossas andanças pelo Japão. Esta viagem não teria sido perfeita como foi sem sua companhia. E no momento mais difícil, em que o frio parecia que ia me vencer, sua energia e bom humor se sobressaíram e me ajudaram a aguentar aquela noite sem fim.

terça-feira, agosto 15, 2006

Dois anjos na Porta de Deus



Este post eu dedico à minha tia Vera, vulgo Akinechan, e minha prima Mireichan, duas lindas mulheres que muito admiro.

Akinechan é uma verdadeira dama. Já ouviram aquele ditado que diz que quando uma mulher precisa dizer que é uma dama, ela na verdade não é? Pois é, ela é exatamente o contrário. Em tudo o que ela faz está presente seu bom gosto, sua elegância.
Em seus gestos delicados, no seu modo de falar calmo e baixo, sua postura elegante, seus belos traços, seu caráter, sua polidez japonesa, seu amor pela família.
Única de sangue O na família. Única hakujin. Inteligentíssima, fala perfeitamente bem o português, o japonês e o inglês. Acredito que isso tenha lhe dado uma visão mais aguçada e crítica das duas culturas, uma visão mais imparcial das coisas da vida.
Vendo sua calma, sua paciência, tenho a impressão de que ela conseguiu aproveitar perfeitamente tudo que o casamento e a maternidade podem ensinar. Ela transmite uma calma, uma compreensão da vida de alguém que já viveu muito, que já passou por muitas experiências, como uma pedra polida pelo ir e vir das águas do mar.

Mirei, minha linda prima japonesa, herdou todas as qualidades de sua mãe. Elegante, bonita, inteligente. Pai japonês, mãe nipo-brasileira. Estudou longos anos no Canadá. Isso faz dela uma pessoa única. Teve uma criação japonesa rígida que moldou seu límpido caráter, mas sem os vícios da mente estreita dos japoneses comuns. Isso se deve ao fato de seus pais serem pessoas tão viajadas, de mente aberta. Uma garota romântica, como todas as garotas. Uma flor em seu momento mais belo.

Agradeço-as por me receberem com tanta hospitalidade em sua casa. Agradeço a Deus por serem minha família. Agradeço-as por dividirem comigo alguns belos momentos nesta longa peregrinação que é a vida.

quinta-feira, agosto 10, 2006

O Haver

Hoje não falo do que tenho passado, mas do que tenho ouvido. Adoro música. Adoro poesia. E Vinicius de Moraes une os dois de forma brilhante.
Acabei de gravar o CD de comemoração do aniversário de 90 anos dele no meu Ipod. É uma seleção de músicas, dedicatórias faladas de pessoas como Tom Jobim, Chico Buarque, e poesias. O segundo track é uma poesia declamada por ele mesmo, e de fundo, o Toquinho com seu violão tocando uma bela melodia bem baixinho. A poesia se chama O Haver.

Nesta poesia, ele rasga seu peito e se expõe por completo. Como se depois de longa caminhada, perdido e sozinho em meio a um deserto numa noite fria, morna, ele se despisse de tudo o que é material e prescindível, e computasse tudo aquilo que restou de si mesmo depois de tantas lutas.

O HAVER

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai! eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo que existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de sua inútil poesia e de sua força inútil.

Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa tola capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem de comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será e virá a ser
E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante.

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta essa obstinação em não fugir do labirinto
Na busca desesperada de uma porta quem sabe inexistente
E essa coragem indizível diante do grande medo
E ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem história
Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento
Esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável
Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços
E esse eterno ressuscitar para ser recrucificado.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio
Pelo momento a vir, quando, emocionada
Ela virá me abrir a porta como uma velha amante
Sem saber que é a minha mais nova namorada.

quarta-feira, agosto 09, 2006

Fotos e pensamentos

Posto hj algumas fotos da semana passada, com os comentários devidos.


Decoração do tanabata nas ruas de Kurashiki.
No Brasil, sempre aprendi a cultura japonesa através do que foi passado de meus avós e de meus pais. Como meus avós vieram ao Brasil quando eram criança, achava que muito das coisas que meus pais faziam era coisa do passado, que os japoneses de agora ainda não faziam mais. E não apenas meus pais, mas toda a comunidade nikkey. Por exemplo, o tanabata matsuri na Liberdade sempre me pareceu algo meio fake, meio coisa do passado...um costume que parece tão de interior, um negócio meio rural...achava que não tinha mais isso no Japão do século 21.
Engano total meu. A toda hora vejo cenas que dão significado a tudo o que somos no Brasil. Como no exemplo do Tanabata matsuri, papeis são colocados em varios locais para as pessoas fazerem seus pedidos, até na minha escola, em todo lugar.

Uma das coisas que acho engraçado: sempre que me despeço de minha avó no Brasil, ela vai até a porta e fica fazendo tchau até eu sumir do mapa. Sempre achei que ela fazia isso porque ela gostava bastante da gente. Não que ela não goste, mas chegando aqui eu percebi que esse é um costume japonês, um modo de mostrar respeito, consideração! Este exemplo pode soar sem significado para alguns, mas para mim significa muito. É o que eu sou, é como fui criado. A cada instante no Japão eu consigo entender melhor a mim mesmo, a minha família e minha comunidade.



Hanabi na sexta feira. 2 horas de fogos de artificio. Tendas que vendem Takoyaki, kakigori, yakissoba, cerveja, refrigerante. Ruas fechadas. Povo na rua, aglomerado de gente, muita gente. Barulho, gente indo, vindo. Prédios gigantes, arquitetura belíssima, show de fogos na frente do rio que corta a cidade. Pessoas vestidas de yukata. Muita gente mexendo em seus celulares.
Que lugar mais único o Japão! A cidade com seus prédios modernos, tecnologia em todo lugar mas parece que suas almas são as mesmas de antigamente. Festejos que tem um aspecto tão rural acontecendo num cenario que parece tão moderno, asfalto. Mais ou menos como uma festa junina em plena Avenida Paulista.


Diálogo retirado no momento de tirar a foto:
- Ei Yuka, quem são aqueles dois de komono??
- Sei lá, vamo lá tirá uma foto com eles??
- Puta, que vergonha...
Fala da Japonesa que nos acompanhava - Esses trajes são de casamento. Vão lá! Não se vê isso a toda hora aqui.....
- Chama a galera então, vamo lá!
- Sumimasen, burajiru no kenshuin desukedo, shashin wo isshouni totemoi desuka??
...

terça-feira, agosto 08, 2006

Garota de Miyasaki conhece Momotaro em pessoa


Gislaine num hospício em Okayama

Gislaine, bolsista de Miyazaki, chegou segunda de noite em nossa casa. Por causa da vinda dela, fizemos uma feijuca, farofa, salada, um jantar bem brasileiro! Foi uma noite muito agradavel!
Terça de manhã acordamos cedo e levei ela pra ver a ponte Seto Ohashi. Por um descuido, acabei esquecendo minha mochila no trem e acabou que ela visitou a província de Kagawa antes de mim. Minha própria mochila, acreditam nisso?? Claro, depois fui lá buscá-la e a encontrei no achados e perdidos chorando por tê-la esquecido assim depois de longo relacionamento. Marco na viagem: por descuido, acabei visitando Kagawa-ken pela primeira vez. Sou muito sortudo. Comigo até os descuidos dão certo. Incrível!
Depois levei-a para visitar o parque Korakuen (lugar que já citei bilhões de vezes aqui). Passeamos bastante e depois voltamos pra perto da estação central de Okayama e comemos Okonomiyaki num restaurante que já conhecia.
Senti muito prazer em levá-la para passear. É um sentimento de irmandade o dos bolsistas. Estamos todos na mesma situação, no mesmo barco. Todos estamos num lugar estranho e nos sentimos como irmãos numa viagem sem igual.
Apresentei Okayama como se fosse minha própria casa e espero ter passado uma boa impressão.

Los hermanos!!


Ai Edu, o Eliel e o Bonilha vieram aqui me ver nesse fim de semana!! E vc, nao vem?? hahahha
Foto tirada na casa do Eliel antes de embarcar pra ca

domingo, agosto 06, 2006

Homestay



Fomos o Leandro e eu juntos fazer homestay no sabado e no domingo. A familia se chamava Tanaka. O pai tem 54 anos e trabalhana na Mitsubishi. Ele é meio caladão mas gente boa. A mãe tinha 59 anos, toma conta de filhos de mães que trabalham e ajuda no Centro de estrangeiros. Sempre recebe estudantes estrangeiros como eu para mostrar um pouco de como é uma família japonesa. Ela é o contrário do pai. Fala mais que a boca e muitas vezes eu me perdia no que ela estava falando. Tudo bem, já estou me acostumando a não entender tudo o que as pessoas falam. Muitas vezes o essencial são apenas algumas palavras chaves e sabendo isso, é possivel formular uma resposta que tenha a ver com o tópico da conversa. Coisas que estrangeiros entendem bem...
Bom, eles tem um filho da minha idade, qual seja, 27 anos, que trabalha perto de Toquio. Ele é 3 meses mais velho que eu e ainda é solteiro.

Quem realmente nos convidou pro Homestay foi a mãe, então conversamos muito mais com ela. Sábado de tarde e a noite conversamos bastante sobre relacionamentos, casamento, a richa entre japoneses e chineses...incrivel como sempre tenho esbarrado neste tópico...será que tenho algo a aprender também com os chineses??
Bom, a verdade é que nossa conversa foi extremamente útil para conhecer melhor o pensamento dos japoneses. A mãe nos considerava japoneses e muitas vezes falava para nós ficarmos no Japão e vivermos por lá, mais ou menos como uma volta dos que foram ao Brasil.
Ela dava muito valor ao sangue. Disse algo que já tinha ouvido antes, que por mais que tenhamos outra cultura, sempre o negócio do sangue fala mais alto, que, no fundo mesmo, eu não conseguiria fugir à minha raça, minha descendência. Que eu, apesar de ter nascido e crescido no Brasil, sempre teria o lado japonês que fala mais alto.
Eu refutei veementemente sua opinião, claro, com toda a educação que me ensinaram, e disse aquilo em que acredito, que gente é igual em qualquer lugar, seja no Paquistão, no Brasil ou no Japão. Muda a cor da pele, mudam traços físicos, mudam cortes de cabelos, mudam valores, costumes, vestimentas, mas isso tudo é muito superficial perto do que o ser humano é no seu âmago. Como já escrevi antes, todo mundo ama, sofre, sente compaixão, amizade, ódio, raiva. Ninguém escapa disso. E terminei dizendo que acho a experiência racial no Brasil, onde se jogam todos as raças num mesmo caldeirão, ótima para eliminar os preconceitos e diferenças, mesmo que isso de fato ainda não tenha acontecido.

Falei também pra ela algo que estive pensando naquele momento. Que se me perguntassem se eu me achava brasileiro ou japonês eu realmente não saberia dizer. Talvez diria: não sou nem japonês nem brasileiro. Já viajei pra vários lugares percebi que todo mundo é igual, todo mundo veio e vai pro mesmo ralo (desculpem a expressão chula....). Sou um ser humano, igual a qualquer um, igual a um brasileiro ou a um japonês. Sou um cidadão do mundo.

Mas ai então ela me falou que antes também pensava assim, mas com a idade e a experiência ela foi mudando seus conceitos. Como também ouvi essa mesma coisa de minha tia, que na hora do juizo final, na hora H, o sangue fala mais alto, eu não sou burro de descartar completamente isso que ela falou.

Hoje notei algo que talvez puxe para a teoria da sra. Tanaka. Percebi como os jovens nikkeys da minha geração no Brasil, apesar de conhecerem muito pouco da cultura de nossoas ancestrais, continuam fazendo de uma forma ou de outra as mesmas coisas que os japoneses fazem. Quero dizer, apesar de eu e minha geração de descendentes termos nascido no Brasil e absorvido a cultura brasileira, inconscientemente vamos para o mesmo lado, fazemos a mesma coisa.
Notei isso vendo os os grupos de dança que participaram no Festival Uraja, que aconteceu no sábado e domingo aqui em Okayama. As danças que os japoneses gostam são feitas sempre em grupo e todos dançam a mesma coreografia, criando a coisa da organização, da harmonia. Os descendentes de japoneses no Brasil gostam de dançar street dance. Tirando todo o chantilly que cobre o essencial, no fundo é a mesma coisa, um grupo de pessoas dançando juntos uma coreografia, diferentemente dum tango ou um forró que se dança a dois.

quinta-feira, agosto 03, 2006

Novos cavaleiros do reino das selvas num Beer Garden no Korakuen



Hoje foi mais um dos meus dias de folga. Lá na escola está acontecendo um evento e meu responsável me falou que não precisava comparecer à escola essa semana, e na semana que vem.
Trabalhei de manha em casa e depois fui almoçar com dois bolsistas novos que ainda não conhecia.
Um é o Danilo, 24 anos, dentista de Bauru e já está estudando aqui faz mais de um ano. A outra bolsista é a Larissa, tem 26 e também é dentista. Ela chegou faz duas semanas em Okayama. Ambos fazem seus estudos na mesma faculdade-hospital, a mesma em que a chinesa Lily faz estágio.
Conheci-os através de uma amiga do Brasil, que também está no Japão como bolsista.
Muito simpáticos, combinamos mais à noite de ir ao Parque Korakuen pois nesta temporada ele fica aberto de noite, e rola umas cadeiras e mesas como um barzinho a céu aberto, bem ao estilo de Sampa. Só faltava o cara na cadeira sem encosto com o violão no colo e tocando umas bossas, MPB...
Consegui juntar toda a família e fomos todos para o Korakuen. Quando digo família, me refiro a Lily, Leandro e Yuka, que são como se fossem meus irmãos aqui.
Hoje fiquei pensando em algo que tenho percebido aqui e que considero importante. Enquanto estou com Lily, Leandro e Yuka, me sinto necessário. Como consigo falar melhor o nihongo e por ser mais velho, acabo sempre organizando os nossos compromissos - a Lily tem 37 anos, mas como ela não fala japonês, a responsabilidade acaba caindo nas minhas mãos. Na verdade, eu tenho de guiá-la. Muitas vezes, eu sou seu intérprete quando ela fala com os japoneses e com a Yuka. Desta forma, sempre me sinto útil, mais participativo, e, consequentemente, me sinto bem por causa disso.
O outro lado, é quando estou na escola convivendo com os estudantes japoneses. Ontem mesmo fui num encontro do pessoal da minha classe promovido por uma professora. Incrível a minha sensação de solidão no meio de tanta gente! Realmente, não saber se comunicar é muito desagradável. Ficava ouvindo as pessoas conversarem e não tinha a mínima idéia do que falavam...
São essas duas situações opostas que tenho convivido estes últimos tempos. Acabo aprendendo com as duas.
Com os bolsistas, tenho trabalhado muito a coisa da liderança, da melhor forma de lidar com cada tipo de pessoa. Acho que tenho me saído bem.
Com os japoneses, acho que tenho aprendido um pouco de humildade, a saber compartilhar, ajudar. Nos momentos em que me sinto só, enquanto eles conversam o japonês sem eu entender, eu penso em como deve ser horrível pra Lily ter de conviver com três pessoas da mesma nacionalidade. Muitas vezes, como somos tres brasileiros e a Yuka não fala inglês, acabamos falando boa parte em português, e sei que isso chateia a Lily. É nessas horas em que estou com os japoneses que dou valor àquelas pessoas de coração mais caloroso que vem me ajudar, sendo pra me explicar o que estão falando ou apenas para trocar uma uma conversa comigo. Me sinto como um deficiente. Acho que só um deficiente sabe aqueles que realmente tem um coração bom, um espírito mais elevado, pois estes são os únicos que se aproximam para compartilhar o que tem. Ele realmente sabe quem são os egoístas e quem não são. Ou talvez consiga distinguir melhor, pois sei que há muita gente que ajuda para proveito próprio e não com sentimento de ajudar o próximo.
Sinto como se estivesse tentando achar o equilíbrio naquelas balanças de dois lados.
Uma puxa para seu lado, cada uma com coisas valiosas para me ensinar mas sempre na medida certa, pois se for exagerado, pode cair e derrubar tudo. Difícil a tarefa, não posso dar uma relaxada, mas acho que tenho aprendido bem.

terça-feira, agosto 01, 2006

Conversas e viagens



Área histórica de Kurashiki



Casa muito bonita

Terça, como não tive aula fui dar um passeio em Kurashiki, cidade a 12 minutos de trem de Okayama. A Asada me acompanhou.
Cidade bonita, histórica, muitas casas seculares, cheiro de história do Japão antigo em qualquer canto.
Conversei bastante com a Asada sobre o Japão, os japoneses, e sobre a relação entre os chineses e os japoneses. Ela ensina o japonês a estrangeiros e já viajou para a Europa, Filipinas e Tailândia. Inteligente, me falou muito de suas opiniões acerca da cultura japonesa, do que é ser japonês, de sua personalidade. Falou um pouco do que já escrevi neste blog num post passado, que os japoneses nem sempre falam o que se passa em seus corações.

Que entre Japão e China aindam restam mágoas do passado e que ainda vai precisar de uma geração ou duas para desaparecer.

Que a China não dá a indepêndencia ao Tibet e a Taiwan porque se fizer isso faria com que muitos de suas províncias reinvindicassem a separação também.

Que entre Toquio, Seoul (Coréia) e Taipei (Taiwan), como houve muita influência da cultura norte-americana, tem uma grande identificação e troca de informações.

Que a escrita chinesa chegou ao Japão através da Coréia, e portanto, muitas palavras coreanas são parecidas com as japonesas. Um coreano(a) demora pouco tempo para aprender o japonês por essa causa.

Por outro lado tentei explicar um pouco da vida dos nikkeys brasileiros, que me acho um cara de sorte por poder conhecer os dois lados da moeda do mundo.

Deixei esta para a última, apenas para os que tiverem paciência para chegar ao final deste longo post.
Ela me falou algo que me chocou. Disse que se você perguntar para um japonês(a) se gosta do Japão ele(a) provavelmente irá dizer que não.
Perguntei por que o japones nao gosta do Japão e ela me falou que o problema são os japoneses. Daí quis ir mais fundo e perguntei qual o problema dos japoneses. Ela me disse aquilo que eu já estava sentindo aqui, que os japoneses nem sempre agem da forma como estão se sentindo. São muito polidos por fora mas nem sempre isso é verdadeiro. Que as pessoas demoram muito para confiar uma nas outras e isso acaba criando panelas, e, se voce entra numa panela você deve respeitar suas regras pois se o japonês não sente que você é um igual, ele não vai se abrir contigo.

Ela ainda me disse muitas coisas. Ainda não consegui digerir tudo o que ela me disse e sinto que isso ainda vai demorar um tempo. Ela, apesar da clareza com que expressava suas idéias sobre o próprio país, sinto que ela é um pouco negativista. Não vi ela elogiando uma vez o Japão, a não ser quando falamos da rivalidade entre japoneses e chineses. Pronto, já sei o que o Japão tem de ruim. Agora só quero saber o que ele tem de bom!!

Momotaro Odori à tardinha, voltando pra casa...não sei se eu sou um ótimo fotógrafo ou o cenário que estava bonito mesmo....acho que os dois!!! hahahaha